terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

O Réquiem Humano: É um privilégio ainda termos um pensador vivo como Noam Chomsky

Por Antonio Siqueira





















Desde os anos de 1980, com a implantação do chamado ‘neoliberalismo’, o sonho americano como conhecemos morre lentamente e este é o tema do documentário Requiem for the American Dream (O fim do Sonho Americano)

O Documentário mostra através de embasamento científico de Noam Chomsky, considerado como o maior intelectual vivo do planeta, como se mantém a estrutura de poder e corrupção pelo mundo. Como uma minúscula oligarquia mundial, através de seu poderio, consegue sabotar qualquer sonho de democracia e bem-estar. 

Mas é preciso alongar e contar toda uma história: Quando Thomas Piketty publicou o seu estudo Capital no Século XXI, um dos maiores levantamentos da distribuição de renda numa linha histórica das últimas décadas, o resultado foi chocante, mas não surpreendente. O economista francês e a sua equipe constataram que estamos no ápice da desigualdade, com uma pequena parcela da população mundial acumulando um excedente de riqueza fora de qualquer projeção e sem qualquer forma de controle ou regulação sobre ela.

O sistema econômico capitalista absorveu anormalidades como essa de forma normatizada, tornando-se anomalias que seriam absurdas em outras configurações de um sistema de economia, mas que no seu seio se tornam características normais. Como essa riqueza e poder se acumularam concentrando-se somente nesse 1% super-rico, tornando-os, segundo a expressão de Adam Smith, “senhores da humanidade”?

Buscando traçar quais os 10 princípios fundamentais da concentração de riqueza e poder, Noam Chomsky — um dos maiores pensadores, linguista e filósofo político vivos — responde a essa questão e elabora reflexões importantes sobre o futuro da humanidade na obra Réquiem Para o Sonho Americano.

O livro é a adaptação do documentário Requiem For American Dream, produzido por Peter Hutchison, Kelly Nyks e Jared P. Scott. Nele, Chomsky expõe, numa espécie de aula, as dez características que baseiam o acúmulo de poder e riqueza na estrutura da economia e da história dos Estados Unidos.

O livro — publicado em 2017 pelo selo Bertrand Brasil, na tradução de Milton Chaves de Almeida — funciona como uma espécie de bloco de anotações do documentário. Todos os elementos abordados por Chomsky no documentário não perdem a força na didática do seu trabalho escrito.



Através de uma série de entrevistas, realizadas durante 4 anos, Chosmky explica Os Dez Princípios da Concentração de Riqueza e Poder:

1. Reduzir a democracia: como uma das maiores preocupações dos “pais fundadores” da sociedade americana, expresso na Constituição e na criação do Senado, a exemplo de James Madinson, era proteger os ricos do “excesso” de democracia, criando mecanismos para que ela “não fugisse do controle”.

2. Moldar a ideologia: o documento “A Crise da Democracia” da Comissão Trilateral, citado por Chomsky, é exemplar nisso.

3. Redesenhar a economia: como o aumento exponencial da participação das instituições financeiras na economia, em detrimento da produção, somada com a desregulação do mercado a partir dos anos 70, potencializada nas décadas posteriores e a elevação do conceito de “insegurança do trabalhador” – celebrado por Alan Greenspan – servem de base para a situação atual.

4. Dividir o fardo: de que maneira o estado de bem estar social dos anos 50 e 60 e a melhora das condições de vida da população foi corroído ao longo do tempo, significando menos impostos para os ricos, que habilmente conseguiram fazer com que a maioria do povo arcasse com os custos básicos da sociedade, enquanto a desigualdade atinge picos históricos hoje em dia.

5. Atacar a noção de solidariedade: obedecendo a máxima de “tudo para mim, nada para os outros” de Adam Smith, como a educação pública e a previdência social foram atacadas e diminuídas, ainda que largamente usada pelas classes A e B no passado e base de sustentação do desenvolvimento da sociedade americana. Partindo desses exemplos, Chomsky mostra como o capitalismo atua para minar nossa capacidade de sentir empatia e solidariedade com o outro, conquistando nossas mentes e nos fazendo refém do egoísmo mais tóxico e abjeto possível.

6. Deixar reguladores atuarem em causa própria: o crescimento absurdo do lobby e como as pessoas escolhidas para definir a legislação são as mesmas que usufruem dela em praticamente todas as áreas da economia e da sociedade.

7. Financiar as eleições:grandes corporações financiando as campanhas presidenciais caríssimas que geram governantes que ficam na mão delas, em um círculo vicioso absurdo. Soa familiar, não?

8. Manter o povo na linha:o ataque ao sindicalismo e todas as organizações de trabalhadores. De que  forma eles eram parte essencial da resistência à exploração e ao abuso e, com o tempo, foram minados, seja diretamente pelo governo, seja pelas próprias organizações, que trataram de demonizar profundamente a atuação sindical, chegando a somente 7% de trabalhadores privados sindicalizados hoje.

9. Criar e propagar o consumismo:de que forma a propaganda, de maneira bem engenhosa e eficaz, tratou de criar gerações de consumidores com pouco ou nenhum senso crítico, um roteiro que todos conhecemos bem.

10. Marginalizar a população:“marginalizar” no sentido de excluir o povo das discussões principais, da participação democrática, minando o controle social e gerando cidadãos apolíticos que se engalfinham num ódio à política e ao governo absolutamente cego que, claro, compromete os maiores interessados na melhoria da sociedade: o próprio povo.

Nada disso é novidade, mas a capacidade de Chosmky em mostrar de maneira concisa e didática o seu impacto, somado ao arquivo histórico dos realizadores, faz com que esse documentário seja um excelente resumo de tudo aquilo que é central para o mundo em que vivemos. Vale o documentário e vale, mais ainda, a leitura de "Réquiem para o sonho americano: Os dez princípios de concentração de renda e poder" .




O documentário exibido pela Netflix de "Réquiem para o sonho americano: Os dez princípios de concentração de renda e  poder"








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