Por Antonio Siqueira
A distopia é o AGORA |
O raciocínio lógico e o pensamento crítico parecem estar em extinção. Teorias conspiratórias alucinadas, notícias falsas em lotes gigantescos, um mundo obscuro onde até o ato de vacinar uma criança, livrando-a de doenças da primeira infância, muitas delas fatais, passou a ser demonizado.
Analisando o comportamento coletivo brasileiro em situações recentes, é evidente que boa parte das pessoas parece ter abandonado a criatividade como cultura do pensar. Talvez pela ausência de uma educação de base incentivadora do hábito do questionamento, certo é que é raro haver um espírito crítico sério nos debates e diálogos, principalmente nos ocorridos na internet. Um vácuo de conexão entre as pessoas que é campo fértil para a desinformação, e explica, inclusive, o porquê da consolidação de notícias falsas. O que habita atualmente o senado, o congresso nacional e, fatalmente, o poder executivo, são produto desta tragédia psicossocial.
Os semelhantes convergem em tudo e os diferentes são completamente ignorados. Não há construção; pessoas se apegam às ideias mais sedutoras ao seu ego e as defendem sem nenhum escrúpulo, isso quando não se utilizam do argumento alheio como verdade universal em assuntos sobre os quais não têm o mínimo conhecimento. Teorias como a “terraplanista” e a do “nazismo de esquerda” encontram porto seguro nos dias atuais. Pseudo Filósofos, associados à extrema direita radical que prolifera na Europa e ameaça a América do Sul. Estes jogos de loucura têm na ignorância o comburente necessário para uma existência prolongada. O foco é idiotizar-se por diversão.
Guillermo Fernández Vázquez, pesquisador madrilenho e historiador, disse claramente: “A direita radical europeia está muito interessada em derrubar este Papa". O que ocorre no Brasil é a extensão de um presente distópico aterrorizante. Suécia, Holanda, Dinamarca, França e Alemanha estão entre as nações mais prósperas do planeta e garantem a seus habitantes os padrões de vida mais altos. No entanto, em todas elas estão em alta populistas que se alimentam do ressentimento e promovem discursos de ódio. Causas de um fenômeno de alcances e conseqüências imprevisíveis. Os neonazistas sentem-se no paraíso. Neste cenário, o mapa mundi se povoou de ultradireitistas. De Le Pen e Salvini na Europa, passando por Duterte, nas Filipinas, até Bolsonaro, no Brasil. Populistas de extrema-direita deixaram de ser uma área restrita de espectadores nostálgicos para se tornarem uma cruzada mundial. Fascistas e neonazistas, xenófobos, fundamentalistas religiosos,
soberanistas, regionalistas, autoritários ou movimentos pós-ideológicos como o italiano Cinco Estrelas formam uma nova cartografia planetária da oferta política. O sucesso eleitoral os tem acompanhado de forma ascendente desde quando, a partir de meados dos anos 80, a extrema direita francesa da Frente Nacional (hoje Reagrupamento Nacional) rompeu o cerco onde vivia confinada com apenas 2% dos votos.
Desinformar e manipular é a lei |
A terra de conquista mais vulnerável continua a ser a Europa. É a partir do Velho Continente, onde os populistas cinzentos estão construindo o que eles mesmos chamam de “uma internacional populista”. Steve Bannon, o ex-conselheiro de Donald Trump, mudou-se para Bruxelas, onde fundou O Movimento com o objetivo de reunir todos os partidos nacionalistas e de extrema direita e tomar de assalto o Parlamento Europeu nas eleições europeias de maio de 2021. Para ele, a Europa “é o centro do levante populista e nacionalista” que levará esses movimentos “à vitória e a governar”, disse Bannon em agosto do ano passado quando chegou a Bruxelas.
Na capital belga, Steve Bannon instalou seu quartel general em uma luxuosa residência de 1.200 metros quadrados com parque e piscina. Seu proprietário é Mischaël Modrikamen, empresário, advogado e líder do partido político liberal-conservador de extrema direita Partido Popular (6% das intenções de voto). O projeto da internacional populista tem uma extensão na Itália através do mosteiro medieval de Trisulti onde, com o apoio de dois outros personagens, Benjamin Harnwell e o cardeal conservador Raymond Leo Burke, espera abrir ali uma academia, isto é, uma escola de capacitação de populistas e nacionalistas. Benjamin Harnwell é o fundador do think tank Dignitatis Humanae Institute (Instituto para a Dignidade Humana), enquanto o cardeal Burke é um adversário ferrenho do Papa Francisco. E é aí que o maior perigo habita. A desconstrução do raciocínio lógico e do que refuta a ciência são a agenda permanente destes senhores. Como diria Paulo Leminsk, "O Poder é o Sexo dos Velhos".
O Brasil da direira radical de Bannon |
Bannon que elegeu, também, Jair Messias Bolsonaro no Brasil, preside o cenáculo daquilo que o pensador italiano Antonio Gramsci chamou de “monstros”. Estes chegaram a perturbar o confronto esquerda-direita, em vigor desde o início do século XX. Uma das frases mais citadas pelos analistas ocidentais pertence a Gramsci. Até parece que a escreveu hoje: “o velho mundo morre e o novo mundo tarda em despontar. Nesse claro-escuro aparecem os monstros”. Por enquanto, andam separados.
Na realidade, vivemos num tempo em que qualquer idiota pode ser o pastor encantado de um gado feliz, que passará pano para todo e qualquer discurso por ele propagado, por mais abjeto que seja. Basta, para isso, ser altissonante, confiante e convincente. Quanto mais absurdo, mais bem aceito. É um nocaute certeiro e sem volta no pensamento crítico contemporâneo.
7 comentários:
Tempos sombrios.... Tenho medo de tudo isso e me sinto fraca, paralisada. O que devemos fazer?
Responder à altura. Educando o que virá.
Doloroso e verdadeiramente sensacional seu texto meu amigo !
Vou roubar este artigo e registrar os devidos créditos. ME PERMITE?
Ivan M. Ribeiro
Não tenho como evitar isso. Pode sim.
Excelência pura. Estava sentindo falta de seus textos.
Perdemos o nosso mundo.
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