O Cavaleiro Andante
Por Antonio Siqueira
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Elomar |
Músico, cantador, poeta, arquiteto, profeta e criador de bodes no interior do sertão baiano,
Elomar Figueira de Melo é das mais incríveis personalidades do coquetel de tendências da musica popular brasileira contemporânea. Assíduo leitor da Bíblia, Evangelhos e histórias e romances da Idade Média, seu universo é descrito aqui. Onde o cristianismo primitivo desenvolve um importante e definitivo papel em sua incrível e já histórica obra poética.
Sua figura irradia uma aura de magia e carisma, encontrada em raras criaturas na MPB. Aos 74 anos de idade, quase 50 criando verdadeiros clássicos, esse baiano de Vitória da Conquista cresceu ouvindo o que ele chama de “Menestréis do Sertão” - cantadores, repentistas, sanfoneiros e poetas populares. Mais tarde, quando se mudou para salvador para estudar arquitetura, entrou em contato com vários mestres da música, tendo recebido aulas da violonista Edyr Cajueiro. A partir dessas aulas, passou estudar música e a ler partituras, paralelamente ao curso de arquitetura. A sua iniciação musical despertou-lhe o interesse pela musica ibérica e, notadamente, pelas reminiscências da música moura, levando-o a conhecer peças de músicos como
Luiz Milan e
Robert de Viseé. Incorpora em sua obra, forte influência da música da Idade Média e em plena a Era da Globalização, faz renascer das cinzas, como a fênix, o gênero predominante do período entre os séculos XV e XVI.
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O menestrel da caatinga |
Seu trabalho está a serviço da realidade dos sertões, do nordeste brasileiro, de onde se extrai o húmus poético para cantar a seca, a fome, o sol abrasador e pregar o amor, a fraternidade, a concórdia, a paixão e o mistério que envolve essa parte mística esquecida do Brasil e suas figuras de tragédia.
“Sempre usei minha canção para pregar o bem e a justiça, e se um dia eu pensar em fazer o contrário, quero que Deus me tire esse dom que me deu.” Diz Elomar, com seu inseparável cigarro de fumo de corda, cujo último trabalho foi o belíssimo
“Cantoria 3/Canto e Solo”, registro de gravações de 1986, feitas no Teatro Castro Alves e m Salvador e no Palácio das Artes de Belo Horizonte.
Mistura de sereno profeta bíblico, cavaleiro andante e trovador a cantar românticas canções de amor desagravando damas e donzelas e vivendo em sombrios castelos ou exaltando o
“Rei dos Reis”, Jesus Cristo. Elomar é a autêntica encarnarão do cantador medieval. Chapéu negro, tipo do legendário cowboy Wyalt Carp, cavanhaque cor de feno, olhos de um azul metálico e sincero, ele é o protótipo da simplicidade e do mistério encarnado. Sua presença é mágica, agreste e energética. Quando dirige a palavra a alguém, Elomar tem por hábito tratar seu interlocutor por “cavaleiro” o que o torna imune a agressões gratuitas e o coloca mental e socialmente de mãos dadas com essa nova postura existencial: democrática e inflada de fluídos de ótimo astral.
A voz de Elomar é mansa e singela. Ela fala da influência da Idade Média na sua obra. “Li muito os romances de cavalaria, como as obras de
Alexandre Dumas,
Michel Zevaco e outros. Sempre contestei veementemente os historiadores universais quando chamam a Idade Media de Idade das Trevas; eu acho esse rótulo absurdo. A idade Média foi e será sempre a Idade das Luzes, não obstante a chamada santa inquisição, que denegriu um pouco essa faixa da história. Os avanços tecnológicos e os ônibus espaciais dos EUA são resultados da Idade Média, pois foi de lá que saíram homens como
Isaac Newton,
Galileu Galilei,
Marco Pólo, Cristóvão Colombo e tantos outros cérebros famosos que pertenceram à Idade Média”:'
Elomar continua falando sobre a importância da Idade Média no seu trabalho e no contexto histórico mundial: “É de lá que saiu tudo, foi na Idade Média, nas escolas monásticas, que se preservou todo o conhecimento antigo. Sobretudo, uma ordem fundada no início do século X, por
Bernard de Clairvaux (São Bernardo de Claraval), que fundou a “Ordem dos Cavaleiros do Templo"
. "Se a Igreja não tivesse massacrado a ordem dos templários, a humanidade estaria hoje num estágio muito superior. Quer no sentido cultural, humanístico, filosófico, religioso, moral, ético... Enfim, se a ordem, tivesse sido preservada das mãos intolerantes da igreja, o mundo estaria vivendo dias bem melhores, mas Deus quis assim”.
Elomar não segue nenhuma religião formalmente, embora seja teísta e tenha absorvido grandes dosagens de ensinamentos da Igreja de Lutero transmitidas por seus pais que eram protestantes. Suas perspectivas para o futuro da humanidade são sombrias e estóicas. Ele vê o mundo baseando-se na ótica de algumas celebridades como o escrito
Aldoux Husley, que ele chama de utopista, e a visão dos profetas bíblicos.
Huxley, na primeira edição de sua obra
, Admirável Mundo Novo, põe uma epígrafe de
Berdieff, autor de Uma Nova Idade Media, onde sintetiza a idéia do romance: “A vida marcha para as utopias e pode ser que nesse século XXI tornem-se realidade. Uma sociedade menos perfeita, mais livre”.
Ele lembra que
Napoleão Bonaparte, a leste de Jerusalém, numa planície chamada Megido, com trinta quilômetros de comprimento por vinte de largura, proferiu essas palavras:
“Soldados, belíssima planície para um campo de batalha”. Segundo a visão Napoleônica e Elomariana, a grande batalha do juízo final ocorrerá naquela planície.
“Napoleão lia os evangelhos constantemente e conhecia as profecias a fundo. O profeta João, na Ilha de Pátimos, disse que só da China via duzentos milhões de guerreiros marchando para o juízo final”.
Elomar prossegue dizendo que a Igreja é um tesouro na Terra, a passar vistas grossas na miséria do povo. É critico ferrenho do Vaticano: “É inadmissível o que acontece”. A fé para este homem é condição sine qua non para uma alma na busca da auto-realização. Nas barrancas do Rio Gavião, localidade distante a 102 quilômetros de Vitória da Conquista, Elomar cria bodes e carneiros. “Eu dou nome aos bodes que crio em homenagens as personalidades que admiro como Marco Pólo, Laurence da Arábia, que eu chamo de Lourenço, em tributo ao amor que ele dedicou a causa da Arábia, quando Rei Faiçal ainda era um príncipe”.
Huxley propõe em seu Admirável Mundo Novo um paraíso restaurado na Terra pelo próprio homem. Todos que pensam tal idéia ser possível, esquecem que, enquanto houver avareza, egoísmo, falta de limites para a ambição, isso não será possível. A ambição é como a guerra; quanto mais ceifa, menos se farta. Elomar completa o papo
: “Eu vejo o mundo através da lente dos profetas. Não poderia ser de outra maneira”.
Discografia
A discografia de Elomar é formidável e de uma qualidade marcante: Até o momento a obra de Elomar, em termos de composição e escrita (partituração) encontra-se no seguinte estágio:
Histórico do Menestrel
11 óperas;
11 antífonas;
4 galopes estradeiros;
1 concerto de violão e orquestra;
1 concerto para piano e orquestra - composto e a ser partiturado;
1 pequeno concerto para sax alto e piano - composto e partiturado;
1 sinfonia - quase toda composta;
12 peças para violão-solo.
As composições para violão na maioria já estão partituradas.
Cancioneiro:
Um caderno de oitenta canções, sendo que a maioria delas já se encontram gravadas e uma pequena parte inédita.
Na Quadrada das Águas Perdidas
Elomar, Elena Rodrigues, Dércio Marques, Xangai e Carlos Pita
Gravado no Seminário de Música da UFBA.
Fantasia Leiga para um Rio Sêco
Elomar e Orquestra Sinfônica da Universidade Federal da Bahia
Gravado no Auditório do Centro de Convenções da Bahia
...Das Barrancas do Rio Gavião
Elomar
Auto da Catingueira
Elomar, Jacques Morelembaum, Marcelo Bernardes, Andrea Daltro, Sônia Penido, Xangai e Dércio Marques
Gravado na Sala de Visitas da Casa dos Carneiros em Gameleira (Vitória da Conquista, BA)
Elomar em Concerto
Elomar, Jacques Morelembaum, Quarteto Bessler-Reis, Paulo Sérgio Santos, Marcelo Bernardes, Antônio Augusto e Octeto Coral de Muri Costa
Gravado ao Vivo na Sala Cecília Meireles (RJ)
ConSertão
Elomar, Arthur Moreira Lima, Paulo Moura e Heraldo do Monte
Gravado na Sala Cecília Meireles (RJ)
Xangai Canta Elomar
Xangai, Elomar, João Omar, Jacques Morelembaum, Eduardo Morelembaum, Eduardo Pereira
Cantoria 1
Elomar, Geraldo Azevedo, Vital Farias, Xangai
Gravado ao Vivo no Teatro Castro Alves (Salvador, BA)
Cantoria 2
Elomar, Geraldo Azevedo, Vital Farias, Xangai
Gravado ao Vivo no Teatro Castro Alves (Salvador, BA)
Cantoria 3 Canto e Solo
Elomar
Gravado ao Vivo no Teatro Castro Alves (Salvador, BA)
Árias Sertânicas
Elomar e João Omar
Gravado no Estúdio Cacalieri — BA
Cartas Catingueiras
Gravado no "Nosso Estúdio" — SP
Concerto Sertanez
Elomar, Turíbio Santos, Xangai e João Omar (part. especial)
Gravado ao vivo no Teatro Castro Alves dias 7, 8, 9 e 10 de janeiro de 1.988 em Salvador, BA
DOCUMENTÁRIO