quarta-feira, 30 de outubro de 2019

A Morte Do Pensamento


Por Antonio Siqueira



A distopia é o AGORA












O raciocínio lógico e o pensamento crítico parecem estar em extinção. Teorias conspiratórias alucinadas, notícias falsas em lotes gigantescos, um mundo obscuro onde até o ato de vacinar uma criança, livrando-a de doenças da primeira infância, muitas delas fatais, passou a ser demonizado.

Analisando o comportamento coletivo brasileiro em situações recentes, é evidente que boa parte das pessoas parece ter abandonado a criatividade como cultura do pensar. Talvez pela ausência de uma educação de base incentivadora do hábito do questionamento, certo é que é raro haver um espírito crítico sério nos debates e diálogos, principalmente nos ocorridos na internet. Um vácuo de conexão entre as pessoas que é campo fértil para a desinformação, e explica, inclusive, o porquê da consolidação de notícias falsas. O que habita atualmente o senado, o congresso nacional e, fatalmente, o poder executivo, são produto desta tragédia psicossocial.

Os semelhantes convergem em tudo e os diferentes são completamente ignorados. Não há construção; pessoas se apegam às ideias mais sedutoras ao seu ego e as defendem sem nenhum escrúpulo, isso quando não se utilizam do argumento alheio como verdade universal em assuntos sobre os quais não têm o mínimo conhecimento. Teorias como a “terraplanista” e a do “nazismo de esquerda” encontram porto seguro nos dias atuais. Pseudo Filósofos, associados à extrema direita radical que prolifera na Europa e ameaça a América do Sul. Estes jogos de loucura têm na ignorância o comburente necessário para uma existência prolongada. O foco é idiotizar-se por diversão.

Guillermo Fernández Vázquez, pesquisador madrilenho e historiador, disse claramente: “A direita radical europeia está muito interessada em derrubar este Papa". O que ocorre no Brasil é a extensão de um presente distópico aterrorizante. Suécia, Holanda, Dinamarca, França e Alemanha estão entre as nações mais prósperas do planeta e garantem a seus habitantes os padrões de vida mais altos. No entanto, em todas elas estão em alta populistas que se alimentam do ressentimento e promovem discursos de ódio. Causas de um fenômeno de alcances e conseqüências imprevisíveis. Os neonazistas sentem-se no paraíso. Neste cenário, o mapa mundi se povoou de ultradireitistas. De Le Pen e Salvini na Europa, passando por Duterte, nas Filipinas, até Bolsonaro, no Brasil. Populistas de extrema-direita deixaram de ser uma área restrita de espectadores nostálgicos para se tornarem uma cruzada mundial. Fascistas e neonazistas, xenófobos, fundamentalistas religiosos,
soberanistas, regionalistas, autoritários ou movimentos pós-ideológicos como o italiano Cinco Estrelas formam uma nova cartografia planetária da oferta política. O sucesso eleitoral os tem acompanhado de forma ascendente desde quando, a partir de meados dos anos 80, a extrema direita francesa da Frente Nacional (hoje Reagrupamento Nacional) rompeu o cerco onde vivia confinada com apenas 2% dos votos.



Desinformar e manipular é a lei


A terra de conquista mais vulnerável continua a ser a Europa. É a partir do Velho Continente, onde os populistas cinzentos estão construindo o que eles mesmos chamam de “uma internacional populista”. Steve Bannon, o ex-conselheiro de Donald Trump, mudou-se para Bruxelas, onde fundou O Movimento com o objetivo de reunir todos os partidos nacionalistas e de extrema direita e tomar de assalto o Parlamento Europeu nas eleições europeias de maio de 2021. Para ele, a Europa “é o centro do levante populista e nacionalista” que levará esses movimentos “à vitória e a governar”, disse Bannon em agosto do ano passado quando chegou a Bruxelas.


Na capital belga, Steve Bannon instalou seu quartel general em uma luxuosa residência de 1.200 metros quadrados com parque e piscina. Seu proprietário é Mischaël Modrikamen, empresário, advogado e líder do partido político liberal-conservador de extrema direita Partido Popular (6% das intenções de voto). O projeto da internacional populista tem uma extensão na Itália através do mosteiro medieval de Trisulti onde, com o apoio de dois outros personagens, Benjamin Harnwell e o cardeal conservador Raymond Leo Burke, espera abrir ali uma academia, isto é, uma escola de capacitação de populistas e nacionalistas. Benjamin Harnwell é o fundador do think tank Dignitatis Humanae Institute (Instituto para a Dignidade Humana), enquanto o cardeal Burke é um adversário ferrenho do Papa Francisco. E é aí que o maior perigo habita. A desconstrução do raciocínio lógico e do que refuta a ciência são a agenda permanente destes senhores. Como diria Paulo Leminsk, "O Poder é o Sexo dos Velhos".



O Brasil da direira radical de Bannon



Bannon que elegeu, também, Jair Messias Bolsonaro no Brasil, preside o cenáculo daquilo que o pensador italiano Antonio Gramsci chamou de “monstros”. Estes chegaram a perturbar o confronto esquerda-direita, em vigor desde o início do século XX. Uma das frases mais citadas pelos analistas ocidentais pertence a Gramsci. Até parece que a escreveu hoje: “o velho mundo morre e o novo mundo tarda em despontar. Nesse claro-escuro aparecem os monstros”. Por enquanto, andam separados. 


Na realidade, vivemos num tempo em que qualquer idiota pode ser o pastor encantado de um gado feliz, que passará pano para todo e qualquer discurso por ele propagado, por mais abjeto que seja. Basta, para isso, ser altissonante, confiante e convincente. Quanto mais absurdo, mais bem aceito. É um nocaute certeiro e sem volta no pensamento crítico contemporâneo.

7 comentários:

Alice disse...

Tempos sombrios.... Tenho medo de tudo isso e me sinto fraca, paralisada. O que devemos fazer?

Antonio Siqueira disse...

Responder à altura. Educando o que virá.

disse...

Doloroso e verdadeiramente sensacional seu texto meu amigo !

Antonio Siqueira disse...

Vou roubar este artigo e registrar os devidos créditos. ME PERMITE?

Ivan M. Ribeiro

Antonio Siqueira disse...

Não tenho como evitar isso. Pode sim.

Anônimo disse...

Excelência pura. Estava sentindo falta de seus textos.

Anônimo disse...

Perdemos o nosso mundo.

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