segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O som do coração



No coração do Blues
Por Antonio Siqueira


    













    O Blues no início representava a expressão cultural através da música de uma minoria. Sua origem está essencialmente ligada à população negra americana. Com simplicidade, sensualidade, poesia,  humor e ironia, o Blues pode ser visto como um reflexo das qualidades e as atitudes dos negros Americanos por mais de um século.

      A definição e o mais importante  sobre o Blues é seu significado além da música, que é uma referência a um estado de espírito. Mas a expressão "O Blues" (The Blues) não  se popularizou antes do término da Guerra Civil Americana, quando sua essência passou a ser vista como um meio de descrever o estado de espírito da população afro-americana. Costumava-se dizer que os negros cantavam este tipo de música para tentar se verem livres da tristeza (blues). No blues é o coração que canta e a é que chora.
Muitos sabem que o Blues teve como berço o Delta do Mississipi, no entanto, a grande maioria pensa que foi nas vizinhanças de Nova Orleans. Errado: este foi o berço do jazz. O Delta que os bluesmen se referem, como uma espécie de país místico, é o delta lamacento do rio Yazoo, que junta sua águas às do rio Mississipi nas proximidades de Vicksburg, região de inundações aonde camadas de lama vão se depositando a cada primavera.

     Esta região possuía terras ricas para o plantio de algodão, e por isso, ali vivia uma densa população afro-americana, que servia como mão-de-obra escrava das lavouras.

     Para aliviar o sofrimento e amenizar o trabalho nos campos, os escravos desenvolveram os cantos de trabalho (work songs) que se tratava de lamentos em forma de gritos melancólicos ritmados pela enxada, martelos e machados. Como não podiam tocar nenhum instrumento, pois os brancos receavam que fosse usado como códigos, incitando à rebelião, a voz se tornou o principal – senão o único – instrumento musical dos negros. Assim como no alvorecer da cultura, porém, em umas das fases mais lamentáveis da humanidade.

    Com a abolição da escravatura, prevaleceu o regime de semi-escravidão, sendo os meeiros vilmente explorados pelos brancos proprietários. No entanto, a pouca liberdade concedida foi suficiente para o contato com a música e o surgimento das juke joints, também conhecidas como barrelhouses, que eram casas noturnas onde se vendiam bebidas clandestinas e tinham um palco tosco para apresentação dos músicos locais.

    A partir de então, o blues começou a tomar forma e se popularizar. Foi quando surgiram grandes nomes e artistas como Robert Jonhson, considerado por muitos o verdadeiro rei do blues do Delta; a célula máxima, a pulsação.

   O estilo veio de uma região na parte sul do Mississippi, romanticamente denominada "O lugar onde o blues nasceu". Foi o primeiro estilo que pôde contar com a gravação de suas músicas por parte de indústrias fonográficas. Embora muitos artistas do Delta tocassem com uma banda, poucos gravaram desta maneira. A maioria das gravações entre 1920 e 1930 consiste em trabalhos solo, com acompanhamento apenas de violão.

   Iniciada com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, a crise econômica norte-americana se transformou na Grande Depressão nos anos 30, afetando toda a economia mundial.
Com isto, as lavouras de algodão do Delta do Mississipi também entraram em uma forte crise, o que ocasionou uma verdadeira fuga dos negros dos campos, numa migração em massa rumo às grandes cidades do Norte. Chicago se tornou a terra prometida pela necessidade de mão-de-obra nas fábricas e pelas favoráveis condições ao blues.

   A Highway 51 e a 61 foram as principais rotas adotadas pela migração. Os trens e trilhos corriam como sangue nas veias do blues. A ferrovia não era um mero meio de transporte, era quase um veículo mágico que leva o negro a transcender a sua condição. Viagem, união e separação: o trem adquiriu no blues uma dimensão mitológica, sendo imitado por vários músicos, principalmente pelos gaitistas da época.

             Nos anos quarenta, o coração do Blues mudou-se para a região sul de Chicago. Lá surgiram grandes nomes como Elmore James, Willie Mabon, Jimmy Rogers, Sonny Boy Williamson, Otis Spann, Willie Dixon, Muddy Waters e Howlin’ Wolf. Entre as canções mais representativas deste período podem ser destacadas Hoochie Coochie Man, Mannish Boy, Sloppy Drunk e Don’t Start Me Talkin.
Foi criado por volta de 1940/1950, amplificando o Delta Blues. Adicionou-se bateria, contra-baixo e piano (às vezes saxofone), criando o que conhecemos hoje como "blues band" (banda de blues). O estilo deu origem às batidas de rock e ao ritmo do funk music nos anos 80 e 90.

        Com o surgimento de fábricas e empregos em outros lugares do país atraíram os negros e que levaram consigo o Blues, difundindo o estilo pelo resto dos EUA. O Blues começava a se espalhar por toda a América do Norte e dois estados específicos, fizeram um bom dever de casa: Texas e Califórnia. Os blues-man nascidos nestes estados geralmente são famosos (exemplo Stevie Ray Vaughan do Texas), e as músicas, bem conhecidas.

        O Texas Blues nasceu na metade dos anos 20, possuía as tradições do Country Blues, porém  o violão mais do que mero acompanhamento, era uma extensão do vocal. Outro estágio do Texas Blues veio depois da Segunda Guerra Mundial, trazendo um estilo totalmente elétrico.

  O apesar de ser mais influenciado pelo Blues do Texas, a costa oeste, onde surgiu o Blues da Califórnia, incorporou uma grande variedade de estilos. Pessoas quem vinham do Texas, Oklahoma, Louisiana, e Arkansas, para trabalharem nos campos e nas fábricas, durante e após a Segunda Guerra Mundial, trouxeram consigo o blues da região que viviam. E, nesta mistura de raízes diferentes, dentro do mesmo estilo, formou-se o Blues da Califórnia.

       Este parágrafo  é dedicado então aos estilos de Blues do Texas que tem como principais representantes: Bobby "Blue" Band, Albert Collins, Lightnin' Hopkins, Blind Willie Johnson, Stevie Ray Vaughan, Lowell Fuson, Freddie King, T-Bone Walker, Clarence Gatemouth Brown e Blind Lemon Jefferson.  E dedicado também ao blues da Califórnia, que é fortemente representado por: The Ford Blues Band, Rod Piazza, Andy Just, entre outros.

     O blues moderno carrega consigo a tradição do blues antigo misturado ao som da guitarra elétrica. Muitas bandas em meados dos anos 60 começaram a adotar este estilo, principalmente bandas inglesas como John Mayall & The Bluesbreakers e The Cream.

O Blues elétrico é o mais conhecido dentre todos os outros estilos, pois conta com um plantel de artistas renomados e músicas bastante conhecidas. Bandas com Led Zeppelin, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Rolling Stones, Yardbirds, Allman Brothers e até Pink Floyd tiveram suas raízes bem bluseiras, imortalizando a influência do Blues para variados estilos musicais.

O destaque para uso da guitarra elétrica agressiva e distorcida baseada em raízes bluseiras vai para o imortal Jimi Hendrix, um dos mais famosos ícones do instrumento.
Surgiram então guitarristas junto com Hendrix, que se tornaram verdadeiros “reis” da guitarra, como Eric Clapton, Jimi Page e Jeff Beck, o trio de guitarras mais conhecido no mundo e que inclusive já gravaram juntos no grupo sessentista “Yardbirds”.

       O blues só foi chegar ao Brasil de carona com o Rock ‘n’ Roll dos anos 50, o rock britânico e americano dos anos 60. Só em meados de 70 começaram a brotar por aqui as primeiras bandas exclusivamente de blues, em sua maioria formadas por jovens brancos da classe média saturados do rock e que não conseguiam encontrar na MPB uma identificação para seus anseios e estilo de vida.
O interesse pelo blues no Brasil cresceu tanto que, no final dos anos 80, começaram a acontecer por aqui festivais especializados.

      O primeiro festival de blues do Brasil foi em Ribeirão Preto, em julho de 1989, reunindo feras como Buddy Guy, Junior Wells, Albert Collins, Magic Slim e Etta James, contando ainda com a participação brasileira de Blues Etílicos e André Christóvam. Este foi carregado no colo em cima do palco por Albert Collins, pois já havia trabalhado de roadie para ele nos EUA.

Outro evento de destaque foi o ocorrido no espaço Circo Voador, Lapa RJ, junho de 1994, tributo a Robert Johnson. Neste festival, nascia um mito alternativo, mas que, arrastada para o pop, teve uma das carreiras mais dignas do rock’n blues nacional, o trovão, a carioquíssima peregrina, Cássia Rejane Eller.

Junto com os festivais surgiram nomes expressivos dentro do cenário nacional, que tocam muito bem este estilo como Celso Blues Boy (Por onde anda?), André Cristovám, Edvaldo Santana, Sólon Fishbone, Fernando Noronha e mais tarde Nuno Mindelis, angolano nacionalizado brasileiro. A banda de blues nacional de maior importância internacional é a Blues Etílicos, fundada em 1987, Baseado em Blues, Big Allanbik e Big Joe Manfra.  Puro blues no coração do blues.





B.B. King - Blues Boys Tune

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11 comentários:

Celso Lins disse...

Pô, tem que meter aqui uns sons do Hendrix, o maior bluseiro de guitra que já existiu! Se alguém quiser saber o que é o Blues, deve ler esse texto que está muito massa.
Sonzão do John Lee Hooker

Dayana disse...

Estou anunciando aqui que estou lendo esse texto, já sabendo que terei de traduzi-lo ao pé da letra.

Unknown disse...

cantar, lo siento ... me encanta el blues. Joe Manfra e Celsito Blues boy: por onde andam?

Anônimo disse...

Gosto de blues, especialmente qdo
Eric Clapton encarna o bom bluzeiro.

André

Anônimo disse...

Eitaaaa...o blues!!!A musica libertária dos negros americanos e que deveria ser o hino da liberdade que eles tanto propagam!

Alex Freitas

Silvia Pelanda disse...

Sonzera hein!
Blues é muiiiiitoo bom...
Bom conhecer um pouco mais da história...

Magda Camila disse...

Ainda tenho aquele cd do Clapton que vc me deu de presente que é só blues, "One More Rider One More Car", lembra? Só achei que você falou pouco dele, meu lindo. Mas deu para sacar que é um texto de apresentação do blues como um todo. E é uma história belíssima e muito bem contada. Um beijo com saudade.

Antonio Siqueira disse...

Oh gente...o blues é mais que um lamento; é entortar todo um conceito harmônico e obter êxito. Tem que sacar muito, sabe? Uma história fascinante, além de ser excelente para embalar uma cornice (regada a um bom alcool, seja ele qual for) sem fazer com o que o corno em questão se sinta deveras brega e inútil, hehehe.

Thanks

Anônimo disse...

Amo blues, amo seus textos e amo seu senso de humor, rs.

Beijos e saudades de todos

Drica

Anônimo disse...

Que texto maravilhoso, meu nobre!

Eloy

Anônimo disse...

divinamente nu o blues aqui!

Juliana

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